A história é muito feia
Por Alexandre Honrado
A História mostra-nos a fealdade da progressão humana, desde as raízes mais remotas às desilusões dos dias que vivemos.
Somos o resultado de muitos ancestrais que, para levarem pão à boca, à sua e só às vezes às dos seus, não olharam a meios para atingirem fins que não eram mais do que os do egoísmo cruel a que chamamos sobrevivência.
A esmagadora maioria das sociedades históricas só o foram por eliminação, progressiva e consciente, das sociedades que as tinham precedido. Obviamente, para trás e para o esquecimento ficaram sempre as sociedades mais frágeis, menos armadas, menos preparadas.
Temos o prazer de pertencer à chamada civilização ocidental – a que protagonizou as mais variadas destruições genocidárias. Os exemplos vão das mais remotas zonas da Europa, às mais expostas zonas das Américas. O rasto de morte foi contínuo e tão profundo que acabou por diluir-se no esquecimento ou nesse confinamento que dura até aos nossos dias: a vida em guetos de minorias brutalmente violentadas (física, intelectual, psicologicamente). A vida colhida para que a morte criasse o espaço para os que vinham colher o que não semearam. Não há grupos, ideologias, religiões inocentes neste caminho de barbárie onde a história de todos nós se alicerçou. Se a colonização desapareceu no século XX – falo da colonização alemã, inglesa, francesa e portuguesa, mas outras houve – não desapareceram as suas heranças nem as suas cicatrizes. O melhor que ficou está na mestiçagem, de genes, culturas, trocas, contactos, criações, aprendizagens. Um formato global onde se acredita poder estar a resposta para um mundo mais apto e menos brutal. Não será o 5 G que nos irá promover como um povo único no planeta, mas filhos de filhos que diluam cores e dores espontaneamente.
Os povos dominantes empurraram os povos dominados, para os arrabaldes – ou para a amnésia. Gosto de pensar no conceito de que a história é escrita pelos dominadores e a memória é o último reduto dos dominados. E que quando formos todos dominados seremos mais próximos e mais justos, sem a necessidade, afinal, do dominador.
Tudo isto me ocorre hoje, ao saber o que se passa em Moçambique, onde o ISIS decapitou crianças de 11 anos, ao contar os mortos em Myanmar, ao saber do enriquecimento de urânio no Irão, ao ler sobre os bombardeamentos na Síria que foram a primeira decisão ativa de Joe Biden ao chegar ao poder, ao revoltar-me perante o incêndio que matou dezenas de imigrantes em Sanaa, no Iémen, sobretudo etíopes. Mas também ao ler e escutar a voz de certos portugueses, que desdenham da sua terra, que a querem subjugada, que desejam o regresso ao obscuro gueto onde viveram os nossos avós, desrespeitando a memória dos que entre eles, os mais altruístas, conseguiram trazer-nos a estes dias de liberdade, de direito, de paz dinâmica onde livremente dizemos sim e felizmente dizemos não.
Alexandre Honrado
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